domingo, 11 de janeiro de 2009

RIBA-TEJO--------------Domingos Lobo

O Ribatejo é uma linha de água
e sobressalto
um fio de cal
e de ternura
um solstício no vinho
e o tresmalho
de um cavalo de vento e de amargura
um rio feito de assombros e de sal
que transporta nos ombros o orvalho
as manhãs inventadas
e as sombras
dos homens construtores de madrugadas
Há na lezíria um canto
imerso
forja suspensa no azul
por onde andou redol a desbravar o espanto
de haver um outro espaço
um outro sul
por onde andou Soeiro sobre o escuro
soletrando os modos de dizer
aos meninos de olhos sobre o chão
que os olhos foram feitos para ver
o futuro
o futuro que está aqui ao rés da mão
O Ribatejo é um istmo de febre
e ansiedade
feito de um sopro de asas
e cetim verde sobre as águas
em ti repousam horizontes a liberdade
da lira de Camões a verter mágoas
há um punhal cigano
espetado no dorso do poente
um toiro lidado mano a mano
as mãos cheias de sol naturalmente
O Ribatejo é um lugar de mosto
e de vertigem
de vinho e sangue e sal
de trigo de suor e de lonjura
sereno como a brisa como um rosto
perdido na paisagem
envolto em tempestades de ternura
sortilégios antigos um arrepio
há por dentro de ti um cheiro a cravo
mouros nostálgicos desenhando o rio
e o mistério das lágrimas
que fazem o homem livre e não o escravo
Mas há sempre um lume crescendo nos teus dedos
a fímbria do inverno o fogo de um fandango
incendiando os medos
sobre a pele do outono vemos-te amargo e doce
andamos no teu corpo a desbravar-te
perdemo-nos em ti
como se fosse
uma réstia de luz a desvendar-te
sobre um manto de sobreiros e de espuma
nasces do verão do azul dos astros
das cores todas da bruma
estás tão perto dos olhos que perdemos
a fala nas ameias
dos castelos
onde habita a memória e o desejo

basta-nos percorrer as tuas veias
sobre um leito de ar e de cegonhas
subir ao teu encontro Riba- Tejo

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