sexta-feira, 2 de abril de 2010

AMIZADE

Ninguém vive, ou sobrevive sozinho. Em perfeita saúde física, mental e espiritual. Todos tendemos para a relação complementar e cúmplice com outros seres humanos.
Geralmente a amizade constrói-se devagarinho, cimentada em tendências semelhantes, gostos parecidos, conceitos idênticos, ideias iguais. Ou assenta em diferenças, mas sempre baseada numa aceitação, num respeito mútuo, numa estima que resiste a qualquer dissidência. E há amigos que mal se vêem se reconhecem, como se tivessem um passado imenso de vivências comuns, de afecto partilhado. E às vezes, largos anos de convívio se desfazem, numa triste constatação de que tudo foi perda de tempo, e não existia verdadeira amizade.
Ser amigo é assim: uma estima, uma afeição terna, capaz de partilha, de consolo, de entendimento, de crítica construtiva, de sinceridade.
No entanto os amigos são pessoas, como nós. E não existe ninguém perfeito. Não podemos criar expectativas a seu respeito, não devemos, aliás, esperar nada deles, sob pena de cairmos de desilusão em desilusão. Devemos dar-lhes compreensão, aceitação, estima, perdão, sem cobranças.
Mas um amigo dá provas de amizade: confia e é confiável; não julga mal nem precipitadamente. Se algo no comportamento do outro lhe desagradou ou deixou dúvidas, deve questioná-lo, para que não haja mal-entendidos a crescer entre eles. Nunca diz mal do amigo para outros, estranhos a esta amizade.
Ser amigo é cultivar a entre-ajuda e o perdão. Não se julgar superior ao outro, nem inferiorizar-se. Não alimentar a inveja, arrancá-la se a percebe crescendo insidiosa, como uma erva daninha. Evitar a convivência excessiva, para que o respeito e o afecto sejam preservados.
As faltas dos amigos escrevem-se na areia, na orla do mar. Claro que é difícil. Muito difícil. Sobretudo se a amizade é constantemente ameaçada por pequenas traições quotidianas: quando o outro ouve criticar o amigo e, em vez de o defender, ajuda a afundá-lo;
quando revela levianamente confidências que só a amizade permitiu. Quando censura o amigo nas suas costas, sem o deixar defender-se... Péssimo é ter consciência de que os seus actos ou omissões corromperam a amizade. Pior que o erro do amigo.
A amizade só é alicerçada em sentimentos fortes, persiste se é séria, mas não sem abalo, acreditem. No fundo, no fundo, é tudo uma questão de respeito, de honestidade, e, às vezes, reconhecimento.
É muito doloroso perder dentro de si a amizade por alguém.
As pessoas, geralmente, esquecem-se que a amizade é uma flor frágil, que requer cuidados: lealdade, rituais de afeição, gratidão, confiança e partilha. Sem ser necessário um abafar o outro. Às vezes mal se vêem, pouco se comunicam, podem estar desaparecidos anos a fio, mas se for preciso, sabem que podem contar uns com os outros. Ou no caso de não se verem por muito tempo, o reencontro é sempre uma festa!
Se este sentimento for maltratado ou negligenciado, a amizade murcha, pode quebrar até. Reatada, persiste, mas nunca mais voltará a ser igual.
Sou muito presa aos meus afectos, às amizades. De há seis anos a esta parte tenho vindo a reencontrar, um a um, os amigos da minha juventude: dos 16, 17, 18, 19 anos. E parece que o tempo não passou. Tem sido uma grande alegria saber e sentir que, em dado momento, marquei e a minha vida foi marcada por seres humanos de eleição. Sobretudo porque éramos jovens, cheios de simplicidade, bem intencionados. Deus me ajude a conservá-los e a merecer conquistar o afecto de outros tão puros como nós éramos.

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