quinta-feira, 23 de setembro de 2010

A LUZ--------------Rogério Carrola

Áspero é agora o voo da luz
marcando Outubro pela implosão da cor
que cai, devagar e fria, das grandes árvores.

O pensamento está quieto. Apoia-se
numa janela de desamor ainda não
totalmente fria,
que o calor das cortinas compõe,
com suas cores quentes,
um cantinho de mão junto ao bafo da boca.

O que mais se agita é a memória
que apaga e ilumina, em grito,
e ao sabor dos olhos,
o que estes contemplam
de fora para dentro e, de dentro,

para a nostalgia do infinito.

Enfraquece lentamente,
a luz,partindo-se,
aqui em pálidos azuis,
além em rubros amarelecidos
de febre natural.

Não é propriamente um pôr-do-sol férreo
mas o pensamento dorido
torna-o deserto não só na cor
como no silêncio.

Esta luz faz tombar as folhas muito devagar.
Parece não chegarem ao chão,
tão lentamente os olhos
as empurram para a quietude última
da emoção.

Que olhar é este que traz a alma de Outono
ao vidro da janela?

Que pensa esta solidão,
como se fosse uma casa,
cheia de nada por dentro

e aberta à vida inteira no rosto que dá
para o horizonte da luz?

Os dedos afagam o débil das cortinas
como se afagassem a retina da dor
ou a gota de sol que vem pousar
na última folha caída dos olhos.

A luz encosta as suas asas
na calma do vento

e paira, tão lentamente como o beijo eterno
que um grande amor deposita
no corpo desse desejo.

Fecham-se as casas. Todas as casas.
E o horizonte da realidade desaparece.

As sombras conquistam o chão e levantam
a noite.

Fria.

A cabeça retira-se das cortinas
e o olhar da luz
anuncia apenas a esperança

de um novo dia.

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